Primeira visão do novo dia que se anuncia
No dia anterior chegamos ao topo da Serra do Faxinal nos últimos instantes de claridade. A noite chegou e com ela também veio o frio, afinal estávamos a mil metros de altitude. Precisávamos encontrar um local para acampar. A área em volta da estrada é na realidade um parque nacional, onde teoricamente seria proibido pernoitar. Há mais de vinte anos eu havia feito meu primeiro roteiro de cicloturismo justamente para essa região, junto com o meu pai, em uma época em que quase todas as pessoas sequer imaginavam que existia uma atividade semelhante. Saíramos de Nova Petrópolis, passando por Gramado, Canela e São Francisco de Paula e a partir de lá pedaláramos em precária estrada de enormes pedras soltas que estavam sendo colocadas para a base do que viria a ser asfalto. Passamos por Tainhas e Cambará do Sul e chegamos ao Itaimbezinho, onde havia um prédio pichado em ruínas que um dia havia abrigado um hotel. Naquela época eu já possuía o mesmo sentimento de querer realizar uma atividade em contato com a natureza, causando o mínimo impacto possível, respeitando todas as formas de vida. Acampamos dentro do que restava do hotel, bem perto da borda do canyon. De lá para cá posso dizer que muita coisa, e ao mesmo tempo pouca coisa, mudou. A área foi interditada para acesso, ficando fechada à visitação. Cercas foram instaladas e o parque ganhou um centro de visitantes, estacionamento e, claro, uma suntuosa portaria e a devida placa indicando as restrições e o preço do acesso. O acampamento foi proibido e um horário rígido e burro de visitação foi imposto. Não se pode mais chegar pedalando - um meio de transporte não poluente, de baixíssimo impacto, adequado à contemplação da natureza, silencioso e que, de quebra, faz bem à saúde. A alegação para a implantação de tais medidas faz sentido, afinal é preciso disciplinar a visitação em uma área que é parque nacional. Num canyon próximo, o Fortaleza, já vi hordas de pseudoturistas chegando, estacionando os carros bem perto da borda do canyon, ligando o som no volume máximo e abrindo as caixas de isopor cheias de cerveja. Uma atividade que, óbvio, não poderia continuar. O que mais me entristece, no entanto, é que nesses vinte anos a atividade educacional evoluiu tão pouco que as mesmas medidas continuam sendo impostas: visitação restrita, horário restrito, proibição de acampamento. Nossa atividade, o cicloturismo, permaneceu equiparada à visitação equivocada dos pseudoturistas bebuns...
Foi por isso que, chegando já no escuro, tratamos de encontrar um local "escondido" para acamparmos. Pedalamos alguns quilômetros pela estrada esburacada até ouvirmos o ruído de água corrente. Em meio a um denso nevoeiro e na mais completa escuridão, atravessamos uma cerca de arame farpado e procuramos uma área mais ou menos plana para montar as barracas. Apanhamos água, preparamos rapidamente comida e café nos fogareiros e praticamente desmaiamos de cansaço.
No dia seguinte, acordei com o ruído de um veículo passando pela estrada.
A poucos metros, no nevoeiro, a estrada.
Levantamos em meio ao denso nevoeiro e providenciamos o café da manhã, que foi rápido. Queríamos desmontar rapidamente o acampamento, para evitar confusão. Logo ao acordar, fui caminhar nas proximidades para fazer um reconhecimento e ver onde estávamos acampados e topei com uma placa presa à cerca de arame, onde letras meio apagadas informavam: "MMA/IBAMA - PARNA APARADOS DA SERRA - ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE".
Desmontei rapidamente a barraca com a ajuda da Tiane e em poucos instantes já havíamos transportado os alforjes e sacos estanques para o lado de fora da cerca. Aproveitei para fotografar enquanto Evânder desmontava acampamento. As gotículas de água aderidas nas teias de aranha estavam muito bonitas.
[Legenda sobre fotografia]
Prontos para continuar a viagem
Evânder concluiu a desmontagem do acampamento, transpôs a cerca e todos nós retornamos para a estrada, onde recolocamos alforjes e sacos estanques nas bicicletas. O dia estava magnífico, com céu azul, poucas nuvens e bastante sol. Em poucos minutos estávamos novamente pedalando pela larga e esburacada estrada em direção a Cambará do Sul.
Viajantes da Alemanha
No cruzamento com a Estrada do Crespo paramos para tirar fotografias e decidir o caminho a percorrer. Resolvemos entrar à esquerda, em direção a Azulega e à estrada asfaltada que liga Tainhas a Cambará do Sul, com a intenção de seguirmos para a Serra do Umbú.
Lá pelas tantas, empolgado com uma descida, soltei os freios para aproveitar a boa velocidade e a inebriante sensação que a velocidade proporciona. De repente, um barulho estranho de bagagem sendo arrastada pela estrada e...
[Fotografia de Tiane]
E agora, José???
Com a trepidação anormal causada pela descida em velocidade, os parafusos que seguravam o bagageiro traseiro perto do canote do selim se soltaram e toda a bagagem forçou o bagageiro para trás, girando sobre os dois parafusos restantes (perto do eixo da roda traseira). Felizmente o pequeno incidente não trouxe maiores consequências e aconteceu perto de uma sombra e de um mata-burro, proporcionando local perfeito para o conserto.
[Fotografia de Tiane]
Equipamento especialmente desenvolvido para estacionamento de bicicletas...
[Fotografia de Tiane]
Evânder procurando o parafuso
Enquanto eu retirava a bagagem da bicicleta, Evânder saiu à procura dos parafusos, que deveriam estar pela estrada. Tarefa quase impossível, como a velha estória da "agulha no palheiro"... E não é que encontrou um deles? Felizmente eu estava levando parafusos de reserva e rapidamente desentortei as hastes do bagageiro (usando a alavanca proporcionada pelas frestas do mata-burro!) e reinstalei o conjunto. A extremidade inferior de um dos lados do bagageiro ficou um pouco frágil, pois a construção desse bagageiro não previa a possibilidade de uso nessas condições, mas coloquei um arame preventivamente para manter o conjunto estável e recoloquei a carga. Tudo pronto para continuar o pedal - agora sem emoções de down hill...!!!
É para lá, no horizonte, que vamos!
Descida
Subida
Quase chegando!
Chegando ao asfalto, paramos para o almoço. Estava bastante quente e a parada na sombra foi muito bem vinda.
Parada para almoço
Após o almoço e um breve descanso, montamos nas bicicletas e passamos a rodar por asfalto, rumo à pequena localidade de Tainhas, subindo e descendo as coxilhas dos Campos de Cima da Serra.
Ao chegarmos nas proximidades de Tainhas, saímos do asfalto e percorremos um pequeno trecho de estrada de chão, desviando de nosso caminho, para que a Tiane pudesse conhecer o centro de Tainhas:
Centro de Tainhas
Feita a fotografia, decidimos lutar contra a vontade de simplesmente descer a Rota do Sol em direção ao litoral e retornamos para a estrada, continuando a pedalar pelas subidas e descidas em direção a São Francisco de Paula. Antes de chegarmos àquela cidade, entretanto, sairíamos do asfalto novamente, seguindo para a esquerda em direção à Serra do Umbú.
Subindo...
Subindo...
Parada para contemplar a paisagem...
Antes de chegarmos no acesso para a Serra do Umbú pedalávamos um pouco separados, com Evânder na frente. De repente, Tiane fez o já tradicional sinal com o polegar virado para baixo: mais um pneu furado!!! Na realidade não foi um furo, foi o remendo que havíamos feito ao lado do ventil, no dia anterior, que não resistiu. Até que aguentou bastante!!! Rapidamente subsituí a câmara de ar e voltamos para a estrada, encontrando Evânder nos esperando no início da estrada de chão. Combinamos que pedalaríamos até um certo horário e a partir dele procuraríamos um local para acampar.
Quase chegando à entrada para a Serra do Umbú
Início da estrada em direção à Serra do Umbú
A estrada estava em condições relativamente boas, muito melhor do que na última vez em que eu havia pedalado por lá. Com a pavimentação asfáltica da Rota do Sol, ligando Tainhas a Terra de Areia, no litoral, o trânsito acabou se intensificando na Serra do Pinto e diminuindo na Serra do Umbu - o que era ótimo para nós, cicloturistas! Pedalamos até o horário combinado e a partir dali começamos a procurar local para passar a noite. Nas proximidades da Floresta Nacional começamos a descer até um pequeno riacho e paramos para verificar os arredores. Deixamos as bicicletas encostadas ao lado da estrada, aos cuidados da Tiane. Evânder foi para o lado esquerdo e eu para a direita, procurando local para o acampamento. Encontrei um belo platô em meio às coxilhas, fora da vista da estrada e perto do riacho. Foi o local escolhido. Para chegar lá precisamos desmontar as tralhas das bicicletas e transpor uma valeta e uma cerca de arame farpado. Depois disso, subir e descer uma coxilha, caminhando pelo campo.
[Fotografia de Tiane]
Vegetação do campo
Acampamento
Montamos acampamento, aproveitamos o riacho para a higiene e tratamos de tomar um bom chimarrão! De um lado o Sol seguia para o horizonte; do outro, a Lua quase cheia chegava para anunciar a noite.
[Trajeto e legendas sobre imagem do Google Earth]
Percurso realizado no segundo dia (em amarelo)
[Trajeto e legendas sobre imagem do Google Earth]
Localização geral do acampamento
Informações disponibilizadas pelo gps:
Distância pedalada: 63,54 km;
Tempo pedalado: 5 h 12 min;Velocidade média: 12,2 km/h;
Velocidade máxima: 46,7 km/h;
Tempo parado: 5 h 17 min;
Velocidade média total: 6,1 km/h;
Elevação máxima: 1037 m de altitude;
Acampamento a 868 m de altitude.
Distância total pedalada: 149,71 km.
No comments:
Post a Comment