Vigésimo quinto dia (16/01/01 – terça) – Uspallata ao Parque Aconcagua
Distância pedalada no dia: 79,64 km.
Distância total acumulada: 2660,20 km.
Tempo pedalado: 5 h 54 min 43 s.
Velocidade média: 13,5 km/h.
Velocidade máxima: 71,0 km/h.
Demoramo-nos bastante na pequena cidade de Uspallata, a 1751 metros de altitude, antes de seguirmos viagem pela Cordilheira dos Andes. Percorremos vários quilômetros em uma região ampla e plana rodeada por altas montanhas antes de entrarmos novamente no estreito vale formado pelo rio Mendoza. As montanhas que surgiam a cada nova curva da estrada eram surpreendentes, quer pelo seu formato, quer pelo colorido. Em uma mesma montanha podíamos ver faixas de minerais avermelhados, esverdeados, azulados, claros e escuros. O ar, livre da presença de poluentes, permitia a visão a grandes distâncias, o que modificava completamente a perspectiva. Uma montanha que parecia estar “logo ali” na verdade estava a muitos quilômetros. A erosão provocada pelas águas na margem do rio parecia ter apenas alguns metros de altura mas, quando comparada com a altura de uma estação férrea abandonada, revelava ter mais de cinqüenta metros!
O dia estava ensolarado e bastante quente, convidando-nos a uma parada em um rio de águas geladas – um afluente do rio Mendoza – que passava sob uma ponte antiga. Bebemos aquela água extremamente limpa que jorrava diretamente dos picos gelados da cordilheira: uma delícia! Jacson enfrentava novamente problemas com a bicicleta, provavelmente ocasionados pelo excesso de peso. Resolveu retirar toda a bagagem e desmontar a roda para verificar o que havia. Fabrice aproveitou a parada forçada para fazer um lanche.
De volta à estrada, seguimos pedalando e cruzamos o rio pouco antes de chegarmos a Punta de Vacas (2325 metros de altitude), onde encontramos uma Gendarmeria Nacional da Argentina e o primeiro acesso ao Parque Provincial Aconcagua, a Quebrada del Río Vacas. Uma trilha acompanhando esse rio dá acesso às paredes leste e norte do Aconcagua para os montanhistas que desejam se aventurar pelas vias de escalada daquelas faces.
Pouco adiante de Punta de Vacas dois vales importantes se encontram, o Vale do Tupungato e o Vale Inca. Tupungato é um imponente vulcão com 6650 metros de altitude, menos famoso mas tão ou mais difícil de ser escalado do que o Aconcagua. No encontro entre esses dois vales a estrada desviava bruscamente para a direita, seguindo pelo Vale Inca ao lado do Río de Las Cuevas. Ao “dobramos a curva” parecia que alguém com espírito brincalhão resolvera ligar um ventilador gigante: recebemos uma verdadeira bofetada de vento. As bicicletas seguiam com dificuldade em primeira marcha quando percebi um estalo e senti que um raio da roda traseira havia se partido. Com a roda torta, a melhor opção foi empurrar a bicicleta nos trechos mais íngremes, evitando que o problema se agravasse. Pouco adiante chegávamos em Los Penitentes – uma estação de esqui a 2580 metros de altitude – e, na providencial parada, a roda foi provisoriamente endireitada (mas ainda com um raio faltando).
Reiniciando a jornada pela Ruta 7, deixamos a estrada asfaltada e seguimos por uma trilha até o Cementerio de los Andinistas. Inúmeras lápides com inscrições nos mais diversos idiomas e alguns túmulos com lembranças de escaladas – fragmentos de cordas ou objetos utilizados nas escaladas – nos fizeram refletir sobre o nosso entusiasmo pela cordilheira. Muitas das pessoas que jamais voltaram da montanha foram para lá despreparadas, sem a menor noção do que significa a escalada no mais alto cume das Américas (e, com exceção do Himalaia, do mundo). Nós, que visitaríamos apenas a base do Aconcagua, sentiríamos na pele os efeitos da altitude.
A tarde avançava e, como queríamos chegar ainda com a luz do dia na entrada do Parque Provincial Aconcagua, voltamos à estrada. Poucos quilômetros adiante chegamos a um dos mais interessantes monumentos naturais de toda a viagem a 2720 metros de altitude. Puente del Inca é uma ponte natural de 50 metros de comprimento, 15 metros de largura e 40 metros de altura que forma uma barreira no vale do rio Las Cuevas, cujas águas vão engrossar mais adiante no rio Mendoza. Exatamente a montante da ponte, jorram três nascentes termais: Netuno (370 C), Champaña (390 C) e Vênus (400 C). As suas águas, com forte teor de calcário, têm o estranho poder de petrificar todo e qualquer objeto nelas intencionalmente deixado pelos turistas. Além disso, conferem às rochas estranhas cores, pelas reações químicas que provocam. O poder curativo destas águas era conhecido desde a época inca, o que explica o nome do local. Aí acorriam, em busca de um tratamento eficaz, indivíduos que padeciam de doenças da pele, artrite, afecções respiratórias...
Impossível resistir! Atravessamos a Puente del Inca e, apesar do vento frio, lá fomos nós para o banho! A pequena piscina natural estava realmente quente e qualquer parte do corpo que ficava exposta ao vento imediatamente denunciava que sair daquela água borbulhante brotando da terra seria bem difícil... No exato instante em que saltei para o vento gelado percebi o significado da palavra hipotermia. Meu corpo tremia convulsivamente de tal maneira que colocar os cadarços das botas nos passadores se tornou uma tarefa quase impossível. Tratei de correr, pular e tentar me esconder do vento descendo as escadarias ao lado da Puente para conseguir me aquecer. Com o frio relativamente controlado, pude me deter na observação do local em que estava. Um hotel havia sido construído ao lado da Puente, aproveitando as termas de água quente. No inverno de 1965, porém, uma avalanche provocou a destruição quase total da construção. A partir desse acontecimento a água carregada de sais minerais passou a recobrir paredes, piso, escadas e teto do que restou da construção, colorindo-a com tons amarelados e dando um aspecto semelhante ao da rocha.
Como o dia estava findando, montamos novamente nas bicicletas e seguimos novamente pela Ruta 7. Paramos no Complejo Aduanero Los Horcones para regulamentar a documentação que necessitaríamos para sair da Argentina. Quando entrássemos em território chileno deveríamos passar por uma aduana chilena. Os trâmites burocráticos foram rápidos e logo pudemos seguir os poucos quilômetros que faltavam até a entrada do parque. Pudemos apreciar a primeira visão do imponente pico do Aconcagua antes mesmo de entrarmos na estrada de chão batido que dá acesso ao Parque Provincial. Nuvens espessas nas proximidades indicavam que, provavelmente, uma nevasca se abatia sobre a montanha. Mesmo no verão as tempestades de neve ocorrem constantemente e as temperaturas podem chegar a trinta graus negativos nos locais mais elevados e expostos ao vento originário do Oceano Pacífico.
Chegamos à entrada do parque e tratamos de montar acampamento para aproveitar os últimos instantes de claridade. Coincidentemente encontramos três gaúchos que nos indicaram os locais mais indicados para acampar. A temperatura começou a cair, forçando-nos a procurar o abrigo da barraca e o conforto do saco de dormir. No dia seguinte teríamos tempo para contemplar a incrível paisagem do Parque Provincial Aconcagua. Estávamos no coração dos Andes!!!
Distância pedalada no dia: 79,64 km.
Distância total acumulada: 2660,20 km.
Tempo pedalado: 5 h 54 min 43 s.
Velocidade média: 13,5 km/h.
Velocidade máxima: 71,0 km/h.
Demoramo-nos bastante na pequena cidade de Uspallata, a 1751 metros de altitude, antes de seguirmos viagem pela Cordilheira dos Andes. Percorremos vários quilômetros em uma região ampla e plana rodeada por altas montanhas antes de entrarmos novamente no estreito vale formado pelo rio Mendoza. As montanhas que surgiam a cada nova curva da estrada eram surpreendentes, quer pelo seu formato, quer pelo colorido. Em uma mesma montanha podíamos ver faixas de minerais avermelhados, esverdeados, azulados, claros e escuros. O ar, livre da presença de poluentes, permitia a visão a grandes distâncias, o que modificava completamente a perspectiva. Uma montanha que parecia estar “logo ali” na verdade estava a muitos quilômetros. A erosão provocada pelas águas na margem do rio parecia ter apenas alguns metros de altura mas, quando comparada com a altura de uma estação férrea abandonada, revelava ter mais de cinqüenta metros!
O dia estava ensolarado e bastante quente, convidando-nos a uma parada em um rio de águas geladas – um afluente do rio Mendoza – que passava sob uma ponte antiga. Bebemos aquela água extremamente limpa que jorrava diretamente dos picos gelados da cordilheira: uma delícia! Jacson enfrentava novamente problemas com a bicicleta, provavelmente ocasionados pelo excesso de peso. Resolveu retirar toda a bagagem e desmontar a roda para verificar o que havia. Fabrice aproveitou a parada forçada para fazer um lanche.
De volta à estrada, seguimos pedalando e cruzamos o rio pouco antes de chegarmos a Punta de Vacas (2325 metros de altitude), onde encontramos uma Gendarmeria Nacional da Argentina e o primeiro acesso ao Parque Provincial Aconcagua, a Quebrada del Río Vacas. Uma trilha acompanhando esse rio dá acesso às paredes leste e norte do Aconcagua para os montanhistas que desejam se aventurar pelas vias de escalada daquelas faces.
Pouco adiante de Punta de Vacas dois vales importantes se encontram, o Vale do Tupungato e o Vale Inca. Tupungato é um imponente vulcão com 6650 metros de altitude, menos famoso mas tão ou mais difícil de ser escalado do que o Aconcagua. No encontro entre esses dois vales a estrada desviava bruscamente para a direita, seguindo pelo Vale Inca ao lado do Río de Las Cuevas. Ao “dobramos a curva” parecia que alguém com espírito brincalhão resolvera ligar um ventilador gigante: recebemos uma verdadeira bofetada de vento. As bicicletas seguiam com dificuldade em primeira marcha quando percebi um estalo e senti que um raio da roda traseira havia se partido. Com a roda torta, a melhor opção foi empurrar a bicicleta nos trechos mais íngremes, evitando que o problema se agravasse. Pouco adiante chegávamos em Los Penitentes – uma estação de esqui a 2580 metros de altitude – e, na providencial parada, a roda foi provisoriamente endireitada (mas ainda com um raio faltando).
Reiniciando a jornada pela Ruta 7, deixamos a estrada asfaltada e seguimos por uma trilha até o Cementerio de los Andinistas. Inúmeras lápides com inscrições nos mais diversos idiomas e alguns túmulos com lembranças de escaladas – fragmentos de cordas ou objetos utilizados nas escaladas – nos fizeram refletir sobre o nosso entusiasmo pela cordilheira. Muitas das pessoas que jamais voltaram da montanha foram para lá despreparadas, sem a menor noção do que significa a escalada no mais alto cume das Américas (e, com exceção do Himalaia, do mundo). Nós, que visitaríamos apenas a base do Aconcagua, sentiríamos na pele os efeitos da altitude.
A tarde avançava e, como queríamos chegar ainda com a luz do dia na entrada do Parque Provincial Aconcagua, voltamos à estrada. Poucos quilômetros adiante chegamos a um dos mais interessantes monumentos naturais de toda a viagem a 2720 metros de altitude. Puente del Inca é uma ponte natural de 50 metros de comprimento, 15 metros de largura e 40 metros de altura que forma uma barreira no vale do rio Las Cuevas, cujas águas vão engrossar mais adiante no rio Mendoza. Exatamente a montante da ponte, jorram três nascentes termais: Netuno (370 C), Champaña (390 C) e Vênus (400 C). As suas águas, com forte teor de calcário, têm o estranho poder de petrificar todo e qualquer objeto nelas intencionalmente deixado pelos turistas. Além disso, conferem às rochas estranhas cores, pelas reações químicas que provocam. O poder curativo destas águas era conhecido desde a época inca, o que explica o nome do local. Aí acorriam, em busca de um tratamento eficaz, indivíduos que padeciam de doenças da pele, artrite, afecções respiratórias...
Impossível resistir! Atravessamos a Puente del Inca e, apesar do vento frio, lá fomos nós para o banho! A pequena piscina natural estava realmente quente e qualquer parte do corpo que ficava exposta ao vento imediatamente denunciava que sair daquela água borbulhante brotando da terra seria bem difícil... No exato instante em que saltei para o vento gelado percebi o significado da palavra hipotermia. Meu corpo tremia convulsivamente de tal maneira que colocar os cadarços das botas nos passadores se tornou uma tarefa quase impossível. Tratei de correr, pular e tentar me esconder do vento descendo as escadarias ao lado da Puente para conseguir me aquecer. Com o frio relativamente controlado, pude me deter na observação do local em que estava. Um hotel havia sido construído ao lado da Puente, aproveitando as termas de água quente. No inverno de 1965, porém, uma avalanche provocou a destruição quase total da construção. A partir desse acontecimento a água carregada de sais minerais passou a recobrir paredes, piso, escadas e teto do que restou da construção, colorindo-a com tons amarelados e dando um aspecto semelhante ao da rocha.
Como o dia estava findando, montamos novamente nas bicicletas e seguimos novamente pela Ruta 7. Paramos no Complejo Aduanero Los Horcones para regulamentar a documentação que necessitaríamos para sair da Argentina. Quando entrássemos em território chileno deveríamos passar por uma aduana chilena. Os trâmites burocráticos foram rápidos e logo pudemos seguir os poucos quilômetros que faltavam até a entrada do parque. Pudemos apreciar a primeira visão do imponente pico do Aconcagua antes mesmo de entrarmos na estrada de chão batido que dá acesso ao Parque Provincial. Nuvens espessas nas proximidades indicavam que, provavelmente, uma nevasca se abatia sobre a montanha. Mesmo no verão as tempestades de neve ocorrem constantemente e as temperaturas podem chegar a trinta graus negativos nos locais mais elevados e expostos ao vento originário do Oceano Pacífico.
Chegamos à entrada do parque e tratamos de montar acampamento para aproveitar os últimos instantes de claridade. Coincidentemente encontramos três gaúchos que nos indicaram os locais mais indicados para acampar. A temperatura começou a cair, forçando-nos a procurar o abrigo da barraca e o conforto do saco de dormir. No dia seguinte teríamos tempo para contemplar a incrível paisagem do Parque Provincial Aconcagua. Estávamos no coração dos Andes!!!
1 comment:
Cara, V é dezmais. Eu estive também por aí, e agora em janeiro pretendo voltar à cordilheira dos Andes, nde farei Bolívia e Perú. Isso está planejado para 26 de dezembro a 11 de fevreiro de 2008.
Irei de carro,como de costume. Aliás, eu fiz 22.000 kms em quase seis semanas entre JP-Ushuaia-JP. Foi a melhor das viagem de carro que empreendi.
Conheci a tua cidade em dezembro de 2004, quando fiz uma viagem de carro com um amigo alemão de João Pessoa até Porto Alegre. Aí, numa vinícola (depósito) tomei vinho direto de tinas de 8, 12, 15 mil m3 desse reiso líquido. A vinícola fica a poucos metros de um centro turístico local. V sabe onde fica, né?
Bom, parabéns pelo feito. V descobriu o quanto vale a penas um passeio fora dos padrões da CVC.
Um dia gente se encontra por aí.
ac buriti /www.fotolog.net.acburiti
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