Vigésimo sexto dia (17/01/01 – quarta) – Parque Provincial Aconcagua
Distância pedalada no dia: -
Distância total acumulada: 2660,20 km.
O Parque Provincial Aconcagua [os termos sem acentos respeitam a grafia em espanhol] está situado na Provincia de Mendoza, a oeste da capital de mesmo nome, inteiramente na República Argentina. Foi declarado Area Nacional Protegida em 1983 e é uma das onze Reservas Naturales que formam o Sistema de Areas Naturales Protegidas da província. Compreendendo aproximadamente 71000 hectares, protege um importante setor dos Andes cuja altitude máxima encontra-se no topo do Cerro Aconcagua – 6962 metros sobre o nível do mar.
O Cerro Aconcagua está inteiramente dentro do parque e não forma limite com a República do Chile; suas coordenadas são 69o 59’ de longitude oeste e 32o 39’ de latitude sul, situando-se, portanto, em latitude um pouco maior do que Nova Petrópolis e Porto Alegre (30o sul). As vias de acesso à montanha são pelo Río Horcones e pelo Río Vacas, levando aos dois principais acampamentos-base, Plaza de Mulas e Plaza Argentina.
A entrada do parque mais freqüentada (80 % dos acessos) se encontra a poucos quilômetros de Puente del Inca; nessa entrada localiza-se a Jefatura Central do parque, em uma cabana denominada Refugio de Horcones, a 2850 metros de altitude. Da Jefatura são coordenadas todas as atividades de manejo do parque, bem como o serviço de resgate de helicóptero.
De acordo com os comentários dos guias internacionais que chegam à montanha todos os anos e que já escalaram montanhas no Himalaia, os quase 7000 metros do Aconcagua equivalem, tanto em esforço físico quanto psicológico, à ascensão de uma montanha de 8000 metros. Isto se deve às condições climáticas dos Andes Centrais que, na mesma altitude, são muito mais severas que no Himalaia onde, por exemplo, a vegetação chega até os 5000 metros de altitude; nos Andes Centrais, ao contrário, a cobertura vegetal dificilmente chega aos 3500 metros acima do nível do mar. No Aconcagua a umidade relativa é extremamente escassa e a porcentagem de oxigênio também diminui pela mesma razão. Os ventos produzem zonas de baixa pressão que intensificam esses efeitos. O aspecto desértico e o isolamento afetam psicologicamente o mais preparado andinista, contribuindo para aumentar a dificuldade da ascensão. Deve-se ter em conta também que os acampamentos-base, dos quais são iniciadas as escaladas, encontram-se a mais de 4000 metros de altitude. A maioria das montanhas da Europa e dos Estados Unidos não chegam a essa altitude, motivo pelo qual os alpinistas europeus e americanos não estão acostumados a essas condições e não dão importância aos sinais de perigo, conhecidos pelo nome genérico de mal da montanha. O mal da montanha é o resultado da falta de aclimatação – adaptação do organismo humano à altitude – e afeta uma grande porcentagem de andinistas. Se não for tratado adequadamente pode dar origem a um edema pulmonar ou cerebral e colocar em risco a vida não somente da pessoa afetada, mas também de seus colegas de escalada, visto que a remoção de uma pessoa incapacitada de uma montanha expõe as pessoas envolvidas a uma série de riscos.
Na manhã do primeiro dia de acampamento no Parque Provincial Aconcagua acordamos com tempo bom, céu azul e sol forte. Ansiosos por apreciar as paisagens das quais antes só tínhamos relatos ou fotografias, não percebemos que os efeitos da altitude já se faziam presentes. Mais tarde eles seriam detectados.
Ainda no início da manhã pudemos testemunhar a habilidade dos pilotos de helicóptero de resgate. Essa mesma aeronave, como um grande adesivo indicava, havia sido utilizada na Eco Challenge da Patagônia, uma das maiores corridas de aventura do mundo (patrocinada pelo Discovery Channel). O ar rarefeito devido à altitude provocava perda de sustentação do aparelho, o que foi facilmente observado quando o helicóptero decolou, seguindo rapidamente por entre as montanhas. No retorno, já com bastante vento, a precisão do pouso naquelas circunstâncias foi impressionante.
Daniel, nosso colega argentino de pedalada por alguns dias despediu-se e seguiu rumo a Viña del Mar. A primeira providência após o café da manhã foi a regularização de nossa permanência no parque (através da validação do Permiso de Ingreso que havíamos recebido em Mendoza), feita em uma tenda em frente à cabana do Refugio de Horcones. Com a permanência de três dias no parque concedida, lá fomos nós conhecer a Laguna de Los Horcones (2900 metros de altitude), mirante natural fantástico onde o Aconcágua pode ser visto refletido na água. Naturalmente, tiramos também uma fotografia em frente à placa que se refere ao Aconcagua. Um comboio de mulas – comumente utilizadas para o transporte do volumoso equipamento para alta montanha – seguia pela trilha ao longo do Vale Horcones rumo à Plaza de Mulas, a 4265 metros de altitude. Pareciam pequenas formigas se comparadas à grandiosidade das montanhas que nos cercavam.
Retornando ao acampamento, combinamos que Fabrice e Jacson iriam a Puente del Inca comprar mantimentos, enquanto Egon e eu mudaríamos a barraca para um local mais adequado, aproveitando a intensidade ainda fraca do vento. Escolhemos uma área coberta por capim nas proximidades do refúgio e tratamos de ancorar a barraca com pedras, o que se revelou uma boa estratégia para enfrentar os ventos fortes. O Vale do Río Horcones não tinha esse nome por acaso...
Os efeitos da altitude começaram a se revelar quando meu resfriado se transformou em mal estar e secreções com sangue. Decidi que continuaria acampado com meu pai e não seguiria mais adiante se não melhorasse; Fabrice e Jacson iriam até Confluencia, bifurcação entre os caminhos para dois acampamentos-base e lá montariam uma barraca para passar a noite.
Preparamos um almoço à base de massa e organizamos o material. Por volta das duas horas da tarde Fabrice e Jacson seguiram caminhando rumo a Confluencia. Meu pai e eu tratamos de colocar as bicicletas juntas, presas pelo meu cadeado a uma cerca de madeira. Lá elas estariam seguras no seu descanso de três dias. Com o material organizado e o novo acampamento montado, fomos caminhar até a aduana onde havíamos estado na tarde anterior. De lá pudemos enviar notícias para casa e ficar sabendo que todos estavam bem. Aproveitamos para tomar um suco de laranja. O vento estava frio e algumas nuvens começavam a se aproximar. Tratamos de voltar, pois os chuviscos que começavam a cair estavam realmente gelados! Algumas vezes eu precisava tossir e eventualmente expelia um pouco de sangue; o organismo avisava que estava debilitado. No retorno ao acampamento tratei de me enfiar no saco de dormir, pois o repouso seria a melhor alternativa. Após a janta preparada pelo pai – pão com doce de leite e, para beber, café com leite –, conversando, ficamos imaginando como estariam se comunicando os nossos companheiros, pois Jacson não falava inglês ou alemão e Fabrice mal “arranhava” o espanhol; logo ficaríamos sabendo que eles haviam conseguido se entender sem problemas. A temperatura caiu bastante durante a noite e o céu, estrelado, nos fez sonhar com as novas paisagens do dia seguinte...
Distância pedalada no dia: -
Distância total acumulada: 2660,20 km.
O Parque Provincial Aconcagua [os termos sem acentos respeitam a grafia em espanhol] está situado na Provincia de Mendoza, a oeste da capital de mesmo nome, inteiramente na República Argentina. Foi declarado Area Nacional Protegida em 1983 e é uma das onze Reservas Naturales que formam o Sistema de Areas Naturales Protegidas da província. Compreendendo aproximadamente 71000 hectares, protege um importante setor dos Andes cuja altitude máxima encontra-se no topo do Cerro Aconcagua – 6962 metros sobre o nível do mar.
O Cerro Aconcagua está inteiramente dentro do parque e não forma limite com a República do Chile; suas coordenadas são 69o 59’ de longitude oeste e 32o 39’ de latitude sul, situando-se, portanto, em latitude um pouco maior do que Nova Petrópolis e Porto Alegre (30o sul). As vias de acesso à montanha são pelo Río Horcones e pelo Río Vacas, levando aos dois principais acampamentos-base, Plaza de Mulas e Plaza Argentina.
A entrada do parque mais freqüentada (80 % dos acessos) se encontra a poucos quilômetros de Puente del Inca; nessa entrada localiza-se a Jefatura Central do parque, em uma cabana denominada Refugio de Horcones, a 2850 metros de altitude. Da Jefatura são coordenadas todas as atividades de manejo do parque, bem como o serviço de resgate de helicóptero.
De acordo com os comentários dos guias internacionais que chegam à montanha todos os anos e que já escalaram montanhas no Himalaia, os quase 7000 metros do Aconcagua equivalem, tanto em esforço físico quanto psicológico, à ascensão de uma montanha de 8000 metros. Isto se deve às condições climáticas dos Andes Centrais que, na mesma altitude, são muito mais severas que no Himalaia onde, por exemplo, a vegetação chega até os 5000 metros de altitude; nos Andes Centrais, ao contrário, a cobertura vegetal dificilmente chega aos 3500 metros acima do nível do mar. No Aconcagua a umidade relativa é extremamente escassa e a porcentagem de oxigênio também diminui pela mesma razão. Os ventos produzem zonas de baixa pressão que intensificam esses efeitos. O aspecto desértico e o isolamento afetam psicologicamente o mais preparado andinista, contribuindo para aumentar a dificuldade da ascensão. Deve-se ter em conta também que os acampamentos-base, dos quais são iniciadas as escaladas, encontram-se a mais de 4000 metros de altitude. A maioria das montanhas da Europa e dos Estados Unidos não chegam a essa altitude, motivo pelo qual os alpinistas europeus e americanos não estão acostumados a essas condições e não dão importância aos sinais de perigo, conhecidos pelo nome genérico de mal da montanha. O mal da montanha é o resultado da falta de aclimatação – adaptação do organismo humano à altitude – e afeta uma grande porcentagem de andinistas. Se não for tratado adequadamente pode dar origem a um edema pulmonar ou cerebral e colocar em risco a vida não somente da pessoa afetada, mas também de seus colegas de escalada, visto que a remoção de uma pessoa incapacitada de uma montanha expõe as pessoas envolvidas a uma série de riscos.
Na manhã do primeiro dia de acampamento no Parque Provincial Aconcagua acordamos com tempo bom, céu azul e sol forte. Ansiosos por apreciar as paisagens das quais antes só tínhamos relatos ou fotografias, não percebemos que os efeitos da altitude já se faziam presentes. Mais tarde eles seriam detectados.
Ainda no início da manhã pudemos testemunhar a habilidade dos pilotos de helicóptero de resgate. Essa mesma aeronave, como um grande adesivo indicava, havia sido utilizada na Eco Challenge da Patagônia, uma das maiores corridas de aventura do mundo (patrocinada pelo Discovery Channel). O ar rarefeito devido à altitude provocava perda de sustentação do aparelho, o que foi facilmente observado quando o helicóptero decolou, seguindo rapidamente por entre as montanhas. No retorno, já com bastante vento, a precisão do pouso naquelas circunstâncias foi impressionante.
Daniel, nosso colega argentino de pedalada por alguns dias despediu-se e seguiu rumo a Viña del Mar. A primeira providência após o café da manhã foi a regularização de nossa permanência no parque (através da validação do Permiso de Ingreso que havíamos recebido em Mendoza), feita em uma tenda em frente à cabana do Refugio de Horcones. Com a permanência de três dias no parque concedida, lá fomos nós conhecer a Laguna de Los Horcones (2900 metros de altitude), mirante natural fantástico onde o Aconcágua pode ser visto refletido na água. Naturalmente, tiramos também uma fotografia em frente à placa que se refere ao Aconcagua. Um comboio de mulas – comumente utilizadas para o transporte do volumoso equipamento para alta montanha – seguia pela trilha ao longo do Vale Horcones rumo à Plaza de Mulas, a 4265 metros de altitude. Pareciam pequenas formigas se comparadas à grandiosidade das montanhas que nos cercavam.
Retornando ao acampamento, combinamos que Fabrice e Jacson iriam a Puente del Inca comprar mantimentos, enquanto Egon e eu mudaríamos a barraca para um local mais adequado, aproveitando a intensidade ainda fraca do vento. Escolhemos uma área coberta por capim nas proximidades do refúgio e tratamos de ancorar a barraca com pedras, o que se revelou uma boa estratégia para enfrentar os ventos fortes. O Vale do Río Horcones não tinha esse nome por acaso...
Os efeitos da altitude começaram a se revelar quando meu resfriado se transformou em mal estar e secreções com sangue. Decidi que continuaria acampado com meu pai e não seguiria mais adiante se não melhorasse; Fabrice e Jacson iriam até Confluencia, bifurcação entre os caminhos para dois acampamentos-base e lá montariam uma barraca para passar a noite.
Preparamos um almoço à base de massa e organizamos o material. Por volta das duas horas da tarde Fabrice e Jacson seguiram caminhando rumo a Confluencia. Meu pai e eu tratamos de colocar as bicicletas juntas, presas pelo meu cadeado a uma cerca de madeira. Lá elas estariam seguras no seu descanso de três dias. Com o material organizado e o novo acampamento montado, fomos caminhar até a aduana onde havíamos estado na tarde anterior. De lá pudemos enviar notícias para casa e ficar sabendo que todos estavam bem. Aproveitamos para tomar um suco de laranja. O vento estava frio e algumas nuvens começavam a se aproximar. Tratamos de voltar, pois os chuviscos que começavam a cair estavam realmente gelados! Algumas vezes eu precisava tossir e eventualmente expelia um pouco de sangue; o organismo avisava que estava debilitado. No retorno ao acampamento tratei de me enfiar no saco de dormir, pois o repouso seria a melhor alternativa. Após a janta preparada pelo pai – pão com doce de leite e, para beber, café com leite –, conversando, ficamos imaginando como estariam se comunicando os nossos companheiros, pois Jacson não falava inglês ou alemão e Fabrice mal “arranhava” o espanhol; logo ficaríamos sabendo que eles haviam conseguido se entender sem problemas. A temperatura caiu bastante durante a noite e o céu, estrelado, nos fez sonhar com as novas paisagens do dia seguinte...
No comments:
Post a Comment